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Capa 1 de agosto de 2018

Intralogística: Igualmente importante, usualmente em segundo plano

Insights sobre as grandes, mas pouco exploradas, oportunidades de ganhos que um trabalho progressivo em intralogística pode trazer.

Ricardo Ruiz Rodrigues
É formado em Engenharia Mecatrônica pela Poli-USP, com pós-graduação em Gestão Empresarial pela UFRJ e MBA internacional pela Universidade de Pittsburgh. Mais de 25 anos de experiência em gestão de operações de Manufatura, Logística e Supply Chain no Brasil e no exterior. Atuou em posições de destaque nestas áreas em empresas como Souza Cruz, BASF e Alpargatas. Está atualmente na rede varejista Magazine Luiza, onde atuou nos últimos seis anos como diretor responsável pela Operação Logística e recentemente está focado em auxiliar a empresa nos projetos de transformação digital e Omnichannel nas operações.

Nas frequentes conversas de troca de experiências que tenho com os colegas da minha rede profissional de logística, confesso que tem sido pouco comum encontrar situações onde há um trabalho estruturado e progressivo de aprimoramento da intralogística como alavanca importante para melhoria de custos e nível de serviço. Usualmente dominam este campo ações como desenvolvimento ou substituição de sistemas, orçamento base-zero, automação de grande porte (equipamentos automáticos), redesenho de malha logística, expansões/racionalizações, otimização da base de fornecedores, entre outros. Não estou aqui dizendo que estas medidas devem perder prioridade e atenção na agenda das lideranças de operações logísticas, mas, sim, que as melhorias de intralogística deveriam conquistar um assento lado a lado com elas.
Examino neste artigo, primeiramente, e de maneira breve, o porquê disto acontecer e, em seguida, descrevo os benefícios que um trabalho progressivo de intralogística pode trazer para uma operação como convite para o leitor repensar e redesenhar seus movimentos estratégicos e táticos.

Por que é usual a intralogística ficar em segundo plano?
Quando percebo que isto está acontecendo em uma dada operação, imediatamente indago o gestor. As justificativas mais comuns que ouço estão resumidas no Quadro a seguir.

Razões apontadas para os trabalhos progressivos de intralogística ficarem em segundo plano
• A operação está sujeita a frequentes oscilações de capacidade e demanda, precisando adaptar-se a elas para sustentar o nível de serviço, e não encontra a estabilidade necessária para otimizar sua intralogística;
• O efeito percebido das ações de melhoria do layout e fluxos operacionais é mais de médio prazo, ao passo em que a operação é cobrada pela alta direção para tomar medidas táticas e trazer retornos rápidos;
• A persistente tendência em achar que grande parte dos problemas enfrentados na operação tem como causa o sistema e/ou os equipamentos (e que tudo se resolverá se forem trocados);
• Não ter “braços” e/ou conhecimento para se engajar em tal iniciativa.

Sinto dizer, mas…nenhuma delas se justifica! Posso até dar um desconto para a segunda, em função das pressões para resultados no curto prazo a que muitos de nós estamos sujeitos, mas ainda assim defendo que com uma boa argumentação e exposição dos benefícios com o tempo e uma prestação de contas periódica e transparente é possível seduzir a alta direção para patrocinar mais a intralogística.
Estas são as causas alegadas, e até não deixam de ser verdadeiras, mas a causa-raiz que defendo é que se desconhecem os benefícios que um trabalho estruturado de intralogística pode trazer e, ao mesmo tempo, não se emprega o devido esforço para demonstrar os efeitos positivos deste tipo de trabalho à alta direção.
Apresento a seguir alguns destes benefícios com o objetivo de sensibilizar o leitor e ajudar a mudar este quadro.

A intralogística como alavanca de resultados
A partir do momento que se toma a decisão de entrar a fundo na análise de problemas e ineficiências dentro das rotinas e dos processos de uma unidade logística é que se começa a descobrir o quanto há de problemas que poderiam ser evitados e que causam impacto negativo nos clientes, bem como o quanto há de desperdícios e paradigmas que não recebem a devida atenção para serem eliminados.
Curiosamente, ao se olhar um problema ou departamento isoladamente, não se encontram deficiências de magnitude suficiente a ponto de chamarem a atenção, mas quando se olha a combinação dos erros e ineficiências das diversas etapas do processo (e suas áreas), aí a surpresa é grande. Para se ter esta visão de maneira clara, faz-se necessário empregar um trabalho progressivo e profundo em todas as rotinas da unidade logística em foco.
Listo e comento brevemente, a seguir, diversas oportunidades escondidas e que naturalmente são reveladas ao se encarar a excelência em intralogística como um movimento estratégico prioritário na empresa.

1. Movimentações desnecessárias
Basta uma medição sem grandes detalhes dos equipamentos de movimentação em sua rotina de trabalho, ou da trajetória de um item ou pedido no processo, para identificar uma série de oportunidades de encurtar trajetórias e otimizar as visitas a um endereço ou posto de trabalho. Ao se converter estas medições em indicadores e estabelecer grupos de trabalho e metas progressivas de otimização, tem-se com o tempo a grata surpresa de conseguir movimentar mais itens com os mesmos recursos, consumir menos energia por item movimentado e reduzir o tempo para atendimento de um pedido. Dependendo do nível de maturidade da operação, as otimizações podem alcançar mais de 50% do que se tinha originalmente.

2. Excesso de esperas e pulmões no processo
É impressionante a tendência de se criar “stagings” nas diversas etapas do processo para falsamente garantir sua continuidade diante das incertezas da etapa anterior. Estas áreas que acumulam produtos não representam somente o desperdício financeiro oriundo do estoque em processo e do espaço em layout ocupado – aumentam também a vulnerabilidade a perdas deste estoque ao deixar os itens expostos (fora da posição de armazenagem) e, ainda pior, trazem grandes riscos de deixar pedidos para trás, pois nas áreas de staging é fácil perder a rastreabilidade do pedido no processo e o controle de FIFO/LIFO. Isto sem falar no quanto se adiciona de tempo desnecessário a cada parada em um pulmão, reduzindo a competitividade da operação em trabalhar com prazos reduzidos.
O gestor focado na intralogística atua junto com a equipe para otimizar os processos e eliminar progressivamente estes stagings/pulmões, tornando o processo cada vez mais fluido, controlado e veloz, reduzindo significativamente as ocorrências de pedidos não atendidos no prazo e o tempo de atendimento (do pedido ao embarque) da operação.

3. Improdutividade nas funções de apoio
Se as atividades produtivas usualmente não são olhadas com o devido detalhe, deixando de se aproveitar oportunidades de melhoria, imagine então o que acontece com as atividades administrativas, nas quais a medição do desperdício de tempo e recursos com atividades desnecessárias ou repetitivas é menos direta… As funções de apoio a uma operação custam de 20% a 40% do orçamento de mão de obra da unidade, mas é raro ver um trabalho consistente de otimização de rotinas, melhoria na comunicação e automatização de tarefas que podem trazer reduções significativas, tanto de custos quanto de erros, e ainda aumentar em muito a velocidade de processamento.
Um mergulho nos processos e atividades administrativos revela situações frequentes de esperas (acontecem, e muito, nos escritórios!), excesso de tarefas de input manual de dados, controles e medições desnecessários ou desnecessariamente complicados, hardware insuficiente, excesso de papel e sistemas/telas ou relatórios pouco intuitivos e difíceis de consultar – isso sem falar no excessivo uso de planilhas como ferramenta para garantir o fluxo operacional (do planejamento de produção ao apontamento de indicadores) e não como ferramenta de análise, que é a função para a qual elas foram criadas.
Nas operações-referência em gestão de desperdício e agilidade das funções de apoio, normalmente a participação deste no orçamento total de mão de obra da unidade não excede 15% e os tempos de processamento não produtivos raramente excedem em 10% o tempo total de processo, indicando que o processo principal espera muito pouco as rotinas administrativas se concluírem para se passar à etapa seguinte.

4. Desempenho individual e meritocracia
É muito usual o gestor de uma unidade operacional estabelecer somente KPIs agregados para orientar os esforços e o foco do time, não fornecendo elementos para que cada operador tenha condições de avaliar sua performance individual ante a média da equipe e as prováveis causas para um desempenho inferior. Isto permite ao gestor premiar os melhores e concentrar os esforços de treinamento e orientação para os que estão abaixo da média, criando uma espiral ascendente de produtividade e performance na operação como um todo a partir da melhoria dos desempenhos individuais. De quebra, para os melhores recursos pode-se ainda desenvolver um plano de carreira baseado no mérito e na evolução nas funções assumidas.
Porém, somente é possível estabelecer métricas de desempenho individual para os operadores de maneira confiável se há um bom conhecimento e medição da intralogística e rotinas da operação. Um trabalho contínuo e sistemático sobre os tópicos de 1 a 3 expostos gera informações valiosas para criar um ambiente meritocrático e evolutivo na operação, otimizando o emprego do orçamento de treinamento (focando onde é necessário) e trazendo saltos significativos na produtividade, velocidade e redução de perdas em um período de 1 a 2 anos.

5. Retaguarda e retrabalho
O gestor deve medir também o índice de retrabalho e erros/perdas gerados no processo causados pelo mau funcionamento das funções de retaguarda, dentre as quais destaco: cadastro, parametrização e manutenção. Os trabalhos de melhoria contínua da intralogística devem também envolver as equipes e os processos destas áreas, compartilhando metas de evolução dos índices de retrabalho.

O uso do espaço físico
O trabalho contínuo de otimização de layout envolve três frentes que podem trazer ganhos anuais superiores a 20% no fator de ocupação (cúbico ou em m²) nos primeiros anos:
a. Otimização de estruturas de armazenagem, corredores, fluxos, embalagens e paletização;
b. Racionalização dos estoques na operação em conjunto com a equipe Comercial/Compras, trabalhando em interações tipo S&OP sobre estoques não sadios, estoques de baixo giro ou o emprego de modalidades diferentes de abastecimento como marketplace ou encomenda;
c. Simplificação do layout do processo, juntamente com a eliminação das áreas desnecessárias de staging já comentadas anteriormente no item 2.
Cada gestor conhece muito bem as nuances de sua operação e de seu negócio, e sabemos que cada uma tem suas peculiaridades e nível de maturidade. Mas acredito que a esta altura já podemos concordar que as oportunidades em intralogística listadas existem factualmente em todas as operações e a somatória delas traz, em 2 a 3 anos de trabalho sistemático de melhoria, ganhos bastante expressivos em custos e performance.
E o mais interessante é que, apesar de no curto prazo ser mais difícil mostrar resultados palpáveis, os investimentos em CAPEX são normalmente baixos, pois grande parte das melhorias se consegue trabalhando com a própria equipe e, quando necessário, com o apoio de uma consultoria especializada em facilitar este processo de melhoria contínua na operação, aplicando ferramentas, metodologias e filosofias de trabalho consagradas, como Kaizen, PDCA e Lean.
Antes de partirmos para as considerações finais, exponho a seguir algumas vantagens adicionais de se colocar a intralogística em pé de igualdade com as demais iniciativas estratégicas e táticas da operação.

A intralogística e…
1…as pessoas
Os trabalhos de melhoria de performance e desperdícios na intralogística de melhor resultado são aqueles nos quais o envolvimento e a participação de toda a equipe da operação (do auxiliar ao gerente) são promovidos, especialmente da base, que contém informações riquíssimas da “rotina como ela é”.
Um efeito colateral disto é um salto importante na motivação dos colaboradores e no clima organizacional, pois o significado do trabalho para cada colaborador aumenta muito quando eles são convidados a, em equipe, ajudar as lideranças a resolver os problemas. Não preciso me estender aqui descrevendo todos os benefícios oriundos de uma equipe motivada e engajada, certo?
2…os departamentos
Deriva do item anterior uma queda das paredes entre os departamentos da Unidade Operacional, uma vez que todos trabalham para alcançar metas comuns e compartilhadas de melhoria. Os demais departamentos da empresa começam também a perceber que a operação passa a ter uma voz única e mais protagonista, que inclusive tem o poder de contagiar a organização.

3…a automação inteligente
Infelizmente se vê muito nas operações o ímpeto de automatizar um processo que não foi trabalhado, entendido e otimizado sucessivamente até se chegar naturalmente à conclusão de que a automação é, enfim, a melhor solução. Não estou falando aqui de pequenas automatizações que reduzem tarefas manuais demoradas, repetitivas, monótonas e vulneráveis (que devem ser realizadas de maneira rápida nos trabalhos de melhoria e produtividade), mas sim equipamentos e sistemas mais complexos que automatizam diversas atividades e que demandam CAPEX e uma boa dose de energia e gestão de mudanças para serem implementados.
Colocar a intralogística como estratégica e ter um programa estruturado e sistemático de melhoria traz como benefício tomadas de decisão sensatas quanto ao emprego da automação na operação, evitando o surgimento de elefantes-brancos, tão comuns em operações que não dispenderam tempo em se tornarem melhores com o que se tem, tratando primeiramente as ineficiências que estão ao alcance da equipe.

4…o novo consumidor
Ouve-se falar mais sobre isto nas operações de varejo, mas o fato é que a indústria precisa se adequar a esta realidade também: a do Consumidor Conectado. Este novo consumidor, que adquire produtos e serviços pelos meios on-line e off-line, demanda cada vez mais agilidade, visibilidade, versatilidade (diferentes opções de ser atendido), transparência, exclusividade, proximidade e uma visão em tempo real de como sua necessidade está sendo atendida. Coloco aqui de maneira bem direta: não dá para uma operação corresponder a esta expectativa sem alcançar um nível de excelência em sua intralogística…

5…o pensamento Lean e a Manufatura Enxuta
A filosofia Lean e os conceitos da Manufatura Enxuta (fluxo contínuo, simplicidade, visibilidade, etc.) têm se mostrado muito aderentes para auxiliar o gestor a realizar um trabalho sistemático e progressivo de melhoria da intralogística. Um ponto-chave desta metodologia é o envolvimento da base da operação, que já indicamos e é fundamental para efetivamente consolidar as melhorias, tornando-as duradouras.

Considerações finais
Procurei neste artigo provocar uma autorreflexão nos líderes de Supply Chain e operações quanto à importância de alçar a intralogística a um patamar estratégico, tirando-a da posição de “segundo plano”. Espero ter ilustrado o quanto há de oportunidades de melhoria nos resultados e performance da operação se os gestores abraçarem esta causa e desenvolverem um trabalho consistente com a participação e o engajamento de todos os níveis e áreas.
É importante notar, porém, que, além da própria barreira interna que o gestor encontrará em sua própria equipe para pensar diferente a respeito da intralogística, deve-se considerar que será necessário também alinhar as expectativas e conquistar o patrocínio da alta direção, pois os resultados normalmente não surgem no curto prazo. Porém, à medida que se dá chance para os resultados aparecerem e eles começam a surgir, é impressionante como a organização se contagia pela ideia e, paulatinamente, em conjunto com outras medidas estratégicas e investimentos nas frentes de Produto e Negócio, começa a se destacar de seus concorrentes no mercado.
Vamos então dar à intralogística a atenção que ela merece?

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