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Conteúdo 26 de julho de 2021

Como em todo o mundo empresarial, os operadores logísticos também precisam atuar a favor da sustentabilidade e do meio ambiente

De acordo com as mais recentes pesquisas, do total dos gastos logísticos brasileiros, a maior parte é com transporte. Dados levantados pelo Instituto de Logística (ILOS), relativos a 2019, indicam que enquanto o Transporte (em todos os seus modais) representava 65,2% do custo logístico total, os Estoques chegaram a 24,6%, a Armazenagem a 6,8% e Administração a 3,4%. Os custos logísticos, como um todo, representaram cerca de 11,9% do PIB nacional (algo próximo aos R$ 859,7 bilhões), enquanto a média mundial está em torno de 10,7%.

O custo do transporte brasileiro em 2019 foi calculado em R$ 561 bilhões (7,7% do PIB) e o modal rodoviário, sem dúvidas, é aquele que somou o maior valor entre todos os demais: R$ 485 bilhões, ou seja, 86,5% do custo do transporte nacional de carga.

Em termos de TKU (tonelada transportada por quilometro útil), as participações de cada modal de transporte são um pouco diferentes: Rodoviário, 61,4% (1.078 bilhões de TKU); Ferroviário, 20,9% (366 bilhões de TKU); Aquaviário, 13,9% (244 bilhões de TKU); Dutoviário, 3,7% (64 bilhões de TKU); e Aeroviário, 0,1% (menos de 1 bilhão de TKU).

Considerando que nossa matriz de transportes é preponderantemente rodoviária, e os motivos para a explicação desse fato serem os mais diversos possíveis, o Brasil ainda se vê obrigado a ter que utilizar as rodovias como principal canal para movimentar mercadorias. Há que se fazer uma observação: apesar de seus vários problemas, tais como roubo de cargas em excesso e o elevado número de acidentes, o modal rodoviário consegue operar com certa eficiência e cumprir o papel logístico a ele reservado.

E o Brasil, ao contrário do que é entendido por muitos, ao ser comparado com outros países, mesmo em termos de infraestrutura rodoviária, deixa a desejar. Ainda de acordo com dados publicados pelo ILOS, para um território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, o País conta com apenas 213 mil quilômetros de estradas asfaltadas. A Alemanha, 21 vezes menor, tem 230 mil quilômetros. Os EUA, com 9,1 milhões de quilômetros quadrados, isto é, 7% maior que o Brasil, possui 4.474 mil quilômetros de estradas asfaltadas, ou seja, 21 vezes mais. A China, com 9,6 milhões de quilômetros quadrados, tem 4.774 mil quilômetros de estradas asfaltadas, a Índia, com 3 milhões de quilômetros quadrados, 3.502 mil quilômetros de rodovias asfaltadas, e a Rússia, com 17 milhões de quilômetros quadrados, asfaltou 1.054 mil quilômetros de rodovias.

Por outro lado, quando discutimos os principais responsáveis pela emissão de CO² (dióxido de carbono), as estatísticas são claras a indicar que, depois da Agropecuária e Mudanças do Uso da Terra, com participação de 73,0% do total, e a Energia, com 9,7%, o transporte é o terceiro maior “poluidor”, representando cerca de 9,0%. Os dados são da Mckinsey e da FGV, relativos a 2017. E o modal rodoviário, que como dissemos é responsável por 61,4% do total de TKU realizado, é responsável por 84,7% das emissões de CO², tendo os demais modais juntos, responsabilidade de apenas 15,3%.

Óbvio que em 2020 houve uma queda significativa na emissão de gases de efeito estufa (GEE), considerando a enorme diminuição das atividades produtivas, não só no Brasil, mas em todo o mundo. Segundo alguns dados divulgados relativos a 2020, o setor de transportes, em todo o mundo, reduziu em 15% as emissões de GEE. Óbvio, também, essas quedas ocorreram quase que exclusivamente pela desaceleração da economia mundial e não, lamentavelmente, por utilização de energias menos poluentes.

Esse cenário, matriz de transporte significativamente rodoviária, faz com que o Brasil tenha de conviver com índices de poluição razoavelmente ‘desconfortáveis’ e custos logísticos muito altos, quando comparados com as médias mundiais. E o transporte rodoviário, além de ser o modal que mais custa por tonelada transportada por quilômetro útil, também é o que mais emite CO². Não há qualquer dúvida, portanto, que ao se planejar o transporte, notadamente no Brasil, providências direcionadas à proteção ambiental e à sustentabilidade também deverão ser consideradas.

Fica parecendo óbvio, portanto, que a busca de uma matriz de transporte mais equilibrada, na qual os demais modais também sejam protagonistas, exige planejamento e disciplina, cuja atividade “multimodal” seja, de fato, levada em consideração. É imperioso, consequentemente, que as políticas públicas voltadas ao desenvolvimento da infraestrutura de transporte sejam elaboradas de forma integrada, sistêmica e prioritariamente. Além de contribuírem para a redução de grande parte do “custo” Brasil, essas políticas também possibilitarão que se trilhe um caminho mais curto para a diminuição das emissões de CO².

Mas por reconhecer que essa realidade não poderá ser mudada no curto prazo, uma vez que faltam investimentos para que outros modais tenham suas redes expandidas, passa a ser imprescindível a busca de outras soluções que reduzam custos operacionais e impactos ambientais negativos. Ou seja, enquanto a retomada concreta de investimentos em infraestrutura de transportes não vem, mesmo considerando os reais esforços do Ministério da Infraestrutura na busca desses objetivos (1), a contribuição das empresas de transporte e de operações logísticos é cada vez mais essencial.

Há que se compreender, porém, que o tema “proteção ao meio ambiente” – ainda não devidamente enraizado na cultura nacional, principalmente no setor de transportes, que sofre um nível de competição muito grande e às vezes até predatório – não é um assunto de ‘trânsito fácil’, assim como não é simples a inclusão, em suas atividades, das técnicas mais modernas de combate, controle e diminuição dos níveis de poluição. Mas há que se fazer algo, posto que o tema “sustentabilidade e proteção ao meio ambiente” é assunto que veio para ficar (2).

Ressalte-se que recente pesquisa feita pelo MIT Center for Transportation & Logistics (MIT CTL) e o Council of Supply Chain Management Professionals (CSCMP), com base em dados de 2020 e que subsidiou o “Relatório Anual de Sustentabilidade na Cadeia de Suprimentos 2021”, mesmo com a Covid-19, as empresas não diminuíram seus esforços para tornarem a cadeia de suprimentos mais sustentável, como poderia se supor, considerando que as maiores atenções estariam direcionadas ao combate da pandemia. Aliás muito pelo contrário, posto que em alguns casos houve aumento da conscientização e priorização do tema (3).

“O ano de 2020 começou com a crescente conscientização e interesse em questões de sustentabilidade. Vendas de produtos com rótulos relacionados à sustentabilidade cresceram sete vezes mais rápido do que os níveis registrados anteriormente e a quantidade de engajamento nas mídias sociais em torno das questões de mudanças climáticas triplicou. As empresas cada vez mais usaram a sustentabilidade como estratégia de marketing e as multinacionais destacaram o compromisso com a sustentabilidade com esforços mais intensos para medir e monitorar os impactos em toda a cadeia de suprimentos”, foi uma das conclusões do relatório.

Não se deve esquecer, inclusive, que a proteção ao meio ambiente e a sustentabilidade são assuntos e atividades que vieram para ficar e que, uma vez praticadas, geram valor às próprias empresas. Larry Fink, CEO da BlackRock (talvez uma das maiores empresas do mundo em gestão de investimentos), em janeiro de 2020, escreveu a seus clientes para enfatizar o compromisso de fazer, da sustentabilidade, um componente-chave na forma de gerar riscos, construir carteiras, desenvolver produtos e se envolver com empresas. E assinalou: “o risco de sustentabilidade – e o risco climático em particular – é um risco de investimento”.

Não à toa incorporou, à toda estratégia da empresa, o conceito ESG (“Enviromment, Security and Governance”). Não há dúvidas, as questões ligadas ao meio ambiente e à sustentabilidade são fundamentais para a evolução e o desempenho dos investimentos de longo prazo e que geram valor aos acionistas (4).

Está claro, pois, que maximizar o valor da empresa e para seus acionistas, agora e no futuro, é um dos objetivos empresariais, e que isso está diretamente ligado à responsabilidade que cada uma delas tem com seus clientes, funcionários, fornecedores, acionistas, comunidades e meio ambiente. E está claro, também, que empresas que buscam lucros a “qualquer preço”, causando problemas à sociedade e ao meio ambiente, destroem valores. Portanto, os investidores que se ocupam das questões ambientais, trabalham a favor da sustentabilidade, principalmente a longo prazo, na medida em que têm exata noção da geração de valor correspondente.

Permito-me, consequentemente, fazer pequenas sugestões de providências que estão no limite de atuação das próprias empresas de transporte e logística, e que não exigem esforços ‘espetaculares’:

A- Adequar as políticas empresariais às políticas ambientais já existentes, quando possível adiantar-se a elas, e atender as exigências dos seus clientes nesse “mister”;

B- Aumentar os níveis de eficiência em todos os processos operacionais, melhorando a produtividade dos equipamentos operados direta ou indiretamente em suas atividades, e instituir índices de medição correspondentes às emissões de gazes de efeito estufa (GEE), inclusive com a realização de inventários e respectivas auditorias independentes;

C – Desenvolver novas práticas e procedimentos operacionais que tenham como principal objetivo a diminuição dos níveis de poluição em todas as atividades da empresa;

D- Estimular todos os seus fornecedores, notadamente os prestadores de serviços, a: (i) observar corretamente a política ambiental estabelecida, respeitando as normas e os procedimentos instituídos; (ii) adotar as melhores práticas operacionais que, entre outras exigências, devem contemplar aumento de produtividade e maior eficiência energética.

Evidente que a realização de programas desse tipo exigirá um gerenciamento eficiente e, de preferência, ligado diretamente à alta direção da empresa, pois como se trata de programa fundamental e, por que não, prioritário, será preciso que todos, funcionários, fornecedores, clientes e demais colaboradores, entendam esse “sinal”.

Importante observar, que as ‘singelas’ medidas aqui propostas, além de contribuírem para que sejam diminuídos os índices de poluição gerados, também colaboram, direta e efetivamente, para a diminuição dos custos operacionais. Sabe-se que no transporte, por exemplo, quem “roda” mais eficientemente, sempre com cargas e por distâncias menores, não só emite menos CO² como também gasta menos. Menor utilização de combustível não só é menos custo operacional como também é menor poluição. Aliás, argumento imbatível para convencer motoristas autônomos ou contratados a aderirem aos programas de combate à poluição.

Com planos de ação semelhantes – e outros ainda melhores e mais inovadores – temos certeza que será possível operar mais e melhor, e poluir menos, contribuindo efetivamente para que a sustentabilidade, no seu conceito mais amplo – “sustentabilidade é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem suas próprias necessidades (5) -, possa ser exercida em sua plenitude.

No momento atual, além de se promover a diversidade, a equidade, a inclusão social e a instituição de sistemas de proteção aos trabalhadores, é preciso adotar ações direcionadas para alcançar emissões “zero de gases de efeito estufa”. Sociedade, governos e empresas, de forma conjunta, precisam trabalhar ininterruptamente na busca de soluções que resolvam as ameaças globais, nas quais as mudanças climáticas são parte importante.

Pois é, até o Papa Francisco se pronunciou a respeito, ao dizer que se torna imprescindível fazer “da resposta à mudança climática uma oportunidade para melhorar as condições gerais de vida, saúde, transporte, energia e segurança, e para criar novas oportunidades de emprego”.

Ao que complementou o Cardeal Parolin, Secretário de Estado do Vaticano: “porque as consequências negativas mais graves da mudança climática muitas vezes afetam os mais vulneráveis: os pobres e as gerações futuras”. E eles, os pobres, são “os menos responsáveis pelo aquecimento global e os mais suscetíveis de serem afetados, uma vez que têm menos capacidade de adaptação e muitas vezes vivem em áreas geográficas que estão particularmente em risco”.

Tudo a ver com empresas “cidadãs” e o “capitalismo consciente”.

 

(1) Vale lembrar que o PNL2035, Plano Nacional de Logística desenvolvido pelo MINFRA, considerando um conjunto de melhorias no sistema de transporte e investimentos na ordem de R$ 480 bilhões em 15 anos (0,45% do PIB ao ano), prevê razoável alteração na matriz de transporte brasileira: Rodoviário, 56,7%, Ferroviário, 30,3%, Aquaviário, 11,3%, Dutoviário, 1,6% e Aeroviário, 0,1%. Segundo estudos realizados por Claudio Frischtak (InterB Consultoria), o Brasil precisaria, para alcançar uma infraestrutura de transportes equivalente aos países mais desenvolvidos, cerca de 2% do PIB ao ano. Ou seja, mais de 4,4 vezes o que está previsto no PNL2035. Nos últimos 20 anos (2001 a 2020), a média anual foi de 0,55% do PIB.

(2) O jornal O Estado de São Paulo, em um de seus editoriais do último dia 19 (“O G-20 ante as crises globais”, reporta uma afirmação, da diretora do FMI, Kristalina Georgieva, que se mostra inquestionável: “ainda menos promissora é a perspectiva para a emergência crônica e difusa das mudanças climáticas. A precificação do carbono segue em suspensão e não se avançou na promessa de mais de uma década de fornecer US$ 100 bilhões para financiar as transições climáticas nos países pobres. Se compromissos mais sólidos não forem conquistados num futuro próximo, a “divergência” entre ricos e pobres se intensificará – e seu impacto será sentido por todos”. O próprio presidente norte-americano, Joe Biden, considerando possível um total entendimento do G-7, ao listar cinco pontos prioritários de sua política externa, foi claro ao citar, entre elas, o combate à mudança climática já como orientadora da COP-26 que será realizada na Escócia no próximo mês de novembro.

(3) Segundo o Relatório, “mais de 80% dos entrevistados afirmaram que a crise não teve impacto nos compromissos relativos à Sustentabilidade no Supply Chain (SCS-Supply Chain Sustainability)”. E até pelo contrário, “83% dos executivos entrevistados disseram que o Covid-19 acelerou a atividade da SCS ou, no mínimo, aumentou a conscientização e trouxe urgência a esse campo em crescimento”. Observação: evidente que nas pequenas e médias empresas essa constatação se deu em um número muito menor – até por falta de recursos financeiros, inclusive antes da pandemia – se comparado com as grandes empresas. E a insistência para que assim fosse veio dos próprios investidores, de organismos internacionais e dos governos comprometidos com a sustentabilidade. E, entre outras, conclui o relatório: diante da pandemia e considerando que a proteção aos direitos humanos, à saúde, ao bem-estar e à segurança dos funcionários, economia de energia e energia renovável passassem a ter prioridade nas empresas, “o compromisso global com as questões sociais e ambientais foi semelhante entre 2019 e 2020”. MIT Center for Transportation & Logistics (MIT CTL) e o Council of Supply Chain Management Professionals (CSCMP). Dados coletados em 2020.

(4) Em pesquisa global realizada pela BlackRock, alguns indicadores importantes: 54% dos participantes consideraram o investimento sustentável como essencial para os resultados dos investimentos; 88% definiram o meio ambiente como a principal prioridade entre todas as demais; e a integração ESG é a abordagem mais popular ao investimento sustentável, com 75% dos participantes integrando ou considerando integrar o ESG nas suas decisões de investimento.

(5) Esse conceito para Sustentabilidade foi definido pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987, através do Relatório Brundtlan.

Paulo Roberto Guedes Paulo Roberto Guedes

Formado em ciências econômicas (Universidade Brás Cubas de Mogi das Cruzes) e mestre em administração de empresas (Escola de Administração de Empresas de São Paulo/FGV). Professor de logística em cursos de pós-graduação na FIA (Fundação Instituto de Administração), ENS (Escola Nacional de Seguros) e FIPECAFI (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras). Membro do Conselho Consultivo da ABOL – Associação Brasileira de Operadores Logísticos, da qual também foi fundador. Membro do Conselho de Administração da ANHUMAS Corretora de Seguros. Diretor de Logística do CIST – Clube Internacional de Seguro de Transporte. Consultor Associado do escritório de Nelson Faria Advogados. Consultor empresarial e palestrante nas áreas de planejamento estratégico, economia e logística. Articulista de diversas revistas e sites, tem mais de 180 artigos publicados. Exerceu cargos de direção em diversas empresas (Veloce Logística, Armazéns Gerais Columbia, Tegma Logística Automotiva, Ryder do Brasil e Cia. Transportadora e Comercial Translor) e em associações dos setores de logística e de transporte (ABOL – Assoc. Brasileira de Operadores Logísticos, NTC&L – Assoc. Nacional do Transporte de Cargas e Logística, ANTV – Assoc. Nacional dos Transportadores de Veículos, ABTI – Assoc. Brasileira de Transp. Internacional e COMTRIM – Comissão de Transporte Internacional da NTC&L). Exerceu cargos de consultoria e aconselhamento em instituição de ensino e pesquisa (Celog-Centro de Excelência em Logística da FGV), de empresas do setor logístico (Veloce, Columbia Logística, Columbia Trading, Eadi Salvador, Consórcio ZFM Resende, Ryder e Translor) e de instituição portuária (CAP-Conselho de Autoridade Portuária dos Portos de Vitória e Barra do Riacho do Espírito Santo). Lecionou em cursos de pós-graduação na área de Logística Empresarial na EAESP/FGV (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas) e em cursos de graduação de economia e administração de empresas em diversas faculdades (FAAP-Fundação Armando Álvares Penteado, Universidade Santana, Faculdades Ibero Americana e Universidade Brás Cubas). Por serviços prestados à classe dos Economistas, agraciado com a Medalha Ministro Celso Furtado, outorgada pelo Conselho Regional de Economia de São Paulo.

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