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Conteúdo 5 de setembro de 2008

A pasta do grampo

Antes, gostaria de agradecer a ABIN, a quem dedico esse artigo.

Afinal de contas, os agentes secretos da instituição foram um duro golpe na monotonia da vida brasileira nas últimas semanas. A economia está em uma fase redundante: nada de muito novo e tudo muito repetitivo…

No campo da política, afora as campanhas para prefeito e vereador, o marasmo é predominante (a não ser pela história do grampo, é claro).
 
Assim, de acordo com uma antiga regra de convivência social, quando não se tem nada para fazer, o melhor é ficar de olho na vizinhança, que sempre sai alguma fofoca da boa.

Uma das funções da ABIN é fazer relatórios semanais para o Presidente da República a respeito do que está acontecendo no ambiente político nacional. Claro, uma boa olhada nos jornais, conversas periódicas com aliados e eventualmente até o posicionamento de agentes em locais estratégicos, como o salão verde da Câmara dos Deputados e alguns restaurantes de Brasília poderiam dar conta do recado.

Mas não! Nossos arapongas devem achar esse trabalho uma chatice; precisam de missões com adrenalina para incorporarem o arquétipo de James Bond. Daí a coisa começa a ficar com mais graça, especialmente com o uso dos equipamentos de espionagem da última moda.

E é nessa ambientação que entra a mais nova celebridade da vida pública nacional: uma pasta, claro, do tipo 007, que contém umas engenhocas capazes de grampear telefones sem fazer ligações físicas com a rede de telecomunicações.

De acordo com a Revista Veja, o ministro do STF, Gilmar Mendes, os senadores Demóstenes Torres, Arthur Virgílio, Tasso Jereissati, Álvaro Dias, Garibaldi Alves foram fuxicados, não escapando nem o chefe de gabinete do presidente da república, Gilberto Carvalho e a mulher-forte do governo Dilma Rousseff. A lista tem vários outros nomes e se supõe a existência de muitos casos desse tipo de espionagem que acabaram não vazando na própria ABIN.

Claro, a situação em foco não é de trazer orgulho. Mas não dá para deixar de achar engraçado.

Vamos falar verdade: a profundidade política no Brasil não vai muito além das saudosas colunas sociais de Ibrahim Sued. O alinhamento entre os representantes dos poderes se dá mais por uma questão de simpatia ou antipatia, do que a temática publica em discussão. Sendo assim, a informação de valor é a fofoca pura. E viva a mala do grampo!

Nem vale a pena aprofundar demasiadamente questão. Afinal, não é novidade que o Estado brasileiro, desde o tempo da ditadura, tem o gosto especial por vigiar e controlar a intimidade das pessoas. O fato em si apenas confirma que as liberdades individuais são muito relativas em nosso país. Mas talvez sejamos forçados a admitir que a nossa sociedade não dá muito valor para isso.

Então, vale mais a pena, imaginar os futuros desdobramentos do caso da mala do grampo.

Na classe política, encerradas as disputas pelas prefeituras municipais, provavelmente haverá novos embates, especialmente entre os parlamentares, provavelmente interessados em liderar o ranking dos grampeados. Quem não tiver sido espionado pela ABIN será rebaixado ao baixo clero. E para evitar isso, mesmo o deputado ou senador que não tiver qualquer importância no processo político, terá a obrigação profissional de mentir que foi vítima das Arapongas. Imagina que decepção para o eleitor, se o seu parlamentar for um medíocre não espionado.

Já dá até para prever a próxima campanha eleitoral: "Vote no Fulano de Tal! Esse sim tem coisas para dizer! Foi o mais grampeado pela ABIN!

Ridículo? Claro que sim. Mas quem tem pouco de memória vai lembrar que há poucos anos, vários candidatos forem eleitos simplesmente  porque declararam terem sido presos políticos. Os torturados, então,  tinham vaga certa.

Passados mais alguns meses, o assunto vai cansar… e já que nem uma solução será dada, a ABIN vai ter a tranqüilidade de continuar suas travessuras. Mas essa vantagem, diríamos competitiva de obtenção de informação terá curto espaço de vida. Dentro de mais algum tempo, a pasta do grampo será acessível a outras pessoas interessadas em xeretar a vida alheia.

No início, tudo será com ares de serviço secreto. Ma a tecnologia acabará clonada, indo direto para a seara da chinelagem: vendas pela Internet; e até nos camelódromos das cidades brasileiras.

Enfim, teremos o igualitário direito de não ter direito a qualquer privacidade. Até namorar pelo telefone deixará de ter graça…

 
Eduardo Starosta é economista: eduardostarosta@uol.com.br

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