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Conteúdo 11 de março de 2008

A unanimidade é burra

Nenhum país moderno encontrou o caminho do Primeiro Mundo, sem que tenha feito, em profundidade, quatro reformas de base: a política, a educacional, a tributária e a trabalhista. É o grande desafio para os afluentes de hoje, entre os quais situa-se o Brasil. Presidentes de ontem fracassaram nesse intento, que se levado a cabo, poderia tê-los consagrado como os maiores ícones da República de todos os tempos.

A esperança renasceu com a vitória de Lula nas eleições de 2002. Mas logo frustrou-se, porque teima em gastar o melhor do seu tempo em atacar seu antecessor. E o Brasil, que viveu estes últimos anos como beneficiário de uma fase de prosperidade sem precedentes, está vendo passar a oportunidade de dar o salto final em direção ao desenvolvimento sustentado. Preferiu o chefe de Estado ficar num padrão de mediocridade, em que faltou ousadia para concretizar as reformas indispensáveis ao grande salto.

Penso que Lula tornou-se um mito, sem chegar a ser um estadista: aquele consola e anima pobres e sofredores, mas só este consegue resgatar as nações de seus atrasos e criar um lugar permanente na História. Com pouco mais de dois anos para encerrar seu governo, tendo tido à sua disposição dois mandatos para transfigurar-se no estadista com que sonharam os brasileiros, o presidente andou muito na contramão da modernidade, travado, talvez por compromissos ideológicos enraizados em seu coração, ao tempo em que, como líder metalúrgico, estava do lado de lá do rio.

Não que não tivesse feito muita coisa boa, mas faltou-lhe aprofundar tudo o que fez e chegar às ultimas conseqüências, razão pela qual os feitos do seu governo aparecem como algo inacabado, insuficiente e desapontador. Faltaram as definições de prioridade, o que concedeu a mesma dimensão a ações de relevo, de cambulhada com outras, de curto fôlego, que estiveram mais para factóides do que para reais avanços.

Faltou gestão à máquina executora em grande parte ocupada pelo empreguismo político-partidário, que privilegiou companheiros de viagem, em detrimento dos que sabem fazer. Sobrou tolerância para com irregularidades cometidas na administração dos bens públicos e do dinheiro dos tributos, o que vem ensejando seguidas denúncias, não só da imprensa, mas também do Ministério Público. Com isso, institucionalizou-se a impunidade, que tem sido a vitamina dos ladrões e corruptos desta República, tomada de assalto por pessoas que sonham enriquecer rápido e à custa de práticas ilegais.

Estas reflexões me vêm à mente, tendo em vista o projeto de lei que visa a concretizar a reforma tributária. Antes de chegar ao Congresso, a proposta já recebe ataques: parlamentares, governadores, prefeitos e o que mais seja.

E o governo, em vez de postar-se no seu propósito de fazer a reforma e deixar que, no Congresso, o local apropriado para o debate, se travem as inevitáveis polêmicas, patrocinadas pelos possíveis prejudicados (alguém já viu fazer-se omelete sem quebrar ovos?), parece tergiversar, ao acenar, para a hipótese de obtenção prévia de unanimidade das opiniões favoráveis. Aliás, foi esse mesmo argumento da falta de unanimidade, que pôs a perder os esforços de uma reforma trabalhista. Mas, por que unanimidade, quando é próprio das democracias decidir-se pelo voto da maioria? Esse foi o esquema que elegeu Lula à presidência. Imaginem se houvesse necessidade do voto unânime dos eleitores! O que teria acontecido? Como, pois, falar-se em unanimidade numa reforma, como essa? Ademais, todos conhecem a genial frase de Nelson Rodrigues, ao afirmar que toda unanimidade é burra. Burra e inútil acrescentaríamos nós.

Agora, é esperar para ver.

Paulo Nathanael é economista e doutor em Educação.

Fonte: www.dcomercio.com.br
 

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