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Conteúdo 31 de julho de 2008

Agora, a rodada de explicações

O presidente Lula chega este domingo a Buenos Aires, uma viagem marcada já há algum tempo para acertos econômicos e diplomáticos, mais ou menos rotineiros, em torno de temas do Mercosul e agora, também, da União dos Países Sul-Americanos . A Argentina sempre tem suas reivindicações e o Brasil, em nome da harmonia do bloco do Cone Sul , concede. A visita é importante politicamente também para a presidente Cristina Kirchner, às voltas com uma séria crise.

A visita de Lula, porém, depois do que aconteceu em Genebra nos últimos dias, com o retumbante fracasso da derradeira tentativa de deslanchar a Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) ganhou uma outra conotação para as relações entre os dois maiores parceiros econômicos e políticos deste lado de baixo do Equador.

Lula vai encontrar um clima pesadíssimo entre os formadores de opinião, os empresários, a mídia, o mundo político e o governo, embora este não o admita abertamente. O mínimo que se está dizendo por lá, refletido em jornais com o poderoso La Nación , é que somos traidores, que renegamos a confiança que los emergentes – e a Argentina em particular – depositaram na diplomacia brasileira.

O ponto de discórdia, apenas para relembrar, foi a decisão do chanceler Celso Amorim de aceitar uma proposta de acordo elaborada pelo diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, uma tentativa quase desesperada de salvar Doha . Amorim, depois de consultar Lula, deu o seu aval. Como o Brasil inegavelmente liderava os países emergentes, a impressão que ficou é que estava tudo bem. Tanto que o clima em Genebra, na sexta-feira, era de alívio, de quase euforia. A proposta não era a ideal, mas era a possível nas circunstâncias. Para o chanceler brasileiro, ela era positiva para los emergentes e para o Mercosul.

Porém, logo depois se viu que não era bem assim. A China e a Índia, parceiros do Brasil no G-20 e que fizeram parte do restrito grupo de 7 negociadores preferenciais criado por Lamy para tentar apressar o acordo, estrilaram e a Argentina ficou amuada. Pelo visto, o Brasil não consultou em profundidade seus aliados antes de comprometer-se com a proposta do diretor-geral da OMC ou não tinha liderança no grupo que imaginava ter.

O Brasil perdeu parte da confiança que havia alcançado ao longo dos árduos anos de negociações da Rodada Doha , com atitudes sempre muito firmes diante da intransigência, das tergiversações e das exigências às vezes descabidas dos países ricos. Em mais de uma ocasião, nosso país foi acusado de emperrar os entendimentos. Chegou-se a insinuar que se o acordo fracassasse – como agora fracassou, por outras razões –, o Brasil seria o responsável.

Com a guinada da sexta-feira, a situação se inverteu. O Brasil passou a ser visto como um aliado dos desenvolvidos, tendo rifado seus antigos parceiros para receber concessões de seu puro interesse. Comentou-se que a moeda de troca teria sido a eliminação, por parte de europeus e americanos, de barreiras e tarifas que dificultam a venda de grandes quantidades do etanol brasileiro para os dois mercados.

É óbvio que o Itamaraty abjura tal interpretação e, de fato, teria sido uma infantilidade diplomática que os excelentes profissionais brasileiros jamais tomariam. De qualquer forma, as explicações brasileiras para a abrupta mudança de posição não convenceram totalmente. É o que o presidente Lula vai começar a sentir na pele a partir deste domingo.

Não é um estrago definitivo; o Brasil, neste campo de defesa dos interesses dos países emergentes, ainda tem um substancial saldo credor. No entanto, será um trabalho árduo este de recompor a confiança e a esperança que havia duramente conquistado. Ainda mais pelo prestígio que China e Índia angariaram quando se insurgiram contra a proposta de Lamy.

Do ponto de vista técnico, é possível que o Itamaraty estivesse totalmente certo ao tentar salvar um acordo qualquer para tentar novas conquistas no futuro. A interpretação que ficou, no entanto, é que o Brasil trocou de lado na última hora. E mais: que saiu de mãos abanando e sem credibilidade.

E o pior ainda: sem grandes opções, porque desde 2003 apostou todas as suas fichas no acordo da OMC e não celebrou nenhum grande acordo paralelo, enquanto outros países emergentes jogavam nas duas frentes. Estavam nas negociações globais e, ao mesmo tempo, abriam mercado em outros países individualmente ou com blocos regionais.

O Itamaraty terá muito o que explicar nos próximos dias.

 
Fonte: www.dcomercio.com.br

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