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Conteúdo 21 de agosto de 2008

Dinheiro, prá que dinheiro?

Veja que noticia maravilhosa: no site da Receita Federal ( http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/arre/2008/Analisemensaljul08.pdf ) saiu o comemorado resultado da arrecadação de impostos de julho. E os nossos agentes da fazenda nacional são realmente competentíssimos. Mesmo com a extinção da CPMF no início do ano,  os caras conseguiram captar R$ 61,9 bilhões no mês passado, chegando a acumular R$ 389 bilhões no decorrer desse ano. Descontando a inflação, os cofres públicos tiveram um enriquecimento de 10,36% na comparação com janeiro a julho do ano passado. Ou seja, a mesada do poder público já aumentou em  R$ 36,52 bilhões.

E o melhor de tudo é que essa dinheirama toda só saiu do seu bolso se você for o dono de alguma das 80 grandes empresas que contribuíram com 72,8% do aumento total da receita que acabei de mencionar. Melhor que isso, só se o Brasil não tivesse levado um baile de bola da Argentina nas Olimpíadas.

Melhor uma pinóia! O que você acharia de pagar R$ 1,40 pelo litro da gasolina, ao invés dos atuais R$ 2,60 (média brasileira)? Legal, não é? Para se chegar a tal desconto é só tirar os impostos embutidos no combustível. Pegando a conta da luz, telefone e do supermercado não fica difícil conferir que na verdade a carga fiscal dessas 80 empresas é paga pelo consumo das pessoas. Então, essa história simpática de que os ricos estão pagando a conta não passa de conversa para boi dormir. Diga-se de passagem, não tenho nada contra os ricos. Até quero ser um deles.

Minha implicância é contra poder público brasileiro mesmo, que usa as grandes empresas para tirar dinheiro do nosso bolso através de impostos elevadíssimos, os quais são naturalmente repassados ao consumidor. Agora o dado estarrecedor: se o ritmo de arrecadação for parecido com o que aconteceu em 2007, no final desse ano as contas bancárias do poder executivo terão uma entrada de aproximadamente R$ 520 bilhões.

Robin Hood, com sua lendária ingenuidade, talvez fizesse o seguinte raciocínio: bem, R$ 520 bi, dividido pela população do Brasil (187 milhões) resulta em algo perto de R$ 2.800,00, ou uma mesada de R$ 233,00 para cada um. Sim, o cálculo é ridículo, apesar de terem linhas políticas que defendem tal lógica para distribuir a riqueza nacional.
 
Provavelmente, o leitor, somando a tributação direta da pessoa física, mais as dezenas de impostos indiretos pagos quando se compra qualquer coisa, contribui para o fisco muito mais do que R$ 233,00 ao mês. E aí pergunta-se: você se considera beneficiário de serviços públicos federais que valham pelo menos o citado montante? Ou pelo menos a metade disso?

Se você respondeu positivamente, então pode parar de ler esse artigo por aqui. Tenha um bom dia!

Mas se tal dado lhe causa um certo mal estar, lamento dizer, mas as coisas vão piorar nas próximas linhas.

Quando os impostos começaram a subir, sem a máscara da inflação, lá na segunda metade dos anos 90, partimos – segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – de uma carga fiscal de 25,19% do PIB, segundo a nova metodologia do IBGE (era 27,29% pela metodologia antiga). Em 2007 o setor público já papava 36,08% da riqueza dos cidadãos e em 2008 dificilmente os impostos ficarão abaixo de 37,5% do PIB. Dose para leão, o que justifica plenamente o tradicional garoto-propaganda da Receita Federal (será que uma hiena não seria melhor?).

O argumento para tal achaque até que era lógico: a necessidade de diminuir o peso da dívida pública do país, herdada de um passado histórico não muito feliz. Bem, o fato é que o lado da receita foi resolvido como acabamos de comprovar. Mas nem por isso a dívida mobiliária federal cedeu: de acordo com o Banco Central, ela aumentou 10,5% na comparação do primeiro semestre desse ano, com o mesmo período de 2007 (perto de 5% em termos reais).

E isso é encrenca da brava: aumento gigantesco da carga fiscal em conjunto com crescimento da dívida pública significa que estão fazendo porcaria com o dinheiro arrecadado. De fato, a despesa do governo (orçamentária) vem crescendo a passos largos, pelos dados do Ministério do Planejamento: 21,66% entre janeiro e junho de 2008 frente a igual período de 2007.

E nada de freio: a promessa de 10 mil novos funcionários públicos nomeados na atual gestão do executivo; o aumento de benefícios da bolsa família; e o veto do Presidente Luis Inácio da Silva à proposta, prevista na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), de reduzir despesas com viagens e publicidade deixam claro que a ânsia por gastar é grande, não havendo superávit primário que resista. Será que devo ainda lembrar que grande parte da dívida contraída é vinculada a moedas estrangeiras (venda de títulos públicos)? Bom, já lembrei!

Pois bem, todo esse festival de números aponta para algo preocupante. O próximo governo vai herdar uma batata muito quente: dívida grande; máquina pública inchada; e capacidade de arrecadação teoricamente esgotada… ou não? De todo o jeito, o futuro presidente dificilmente resistirá a buscar mais dinheiro da sociedade para ter condições de governo. E lá virão mais impostos, lembrando que até o atual Chefe do Executivo vem trabalhando nos bastidores pela volta da CPMF.

O problema é sério. Pode significar o colapso brasileiro no futuro. Algo parecido com o que ocorreu na Argentina em 2001 e que pode voltar a acontecer nos próximos meses.

Hora de o governo começar a gastar menos. E nesse contexto, talvez seja interessante pensar em um ministro da fazenda que não seja economista. Já tivemos engenheiros, sociólogos e até médicos chefiando a pasta.

O próximo bem que poderia ser músico. Minha preferência fica para o Martinho da Vila, com seu plano de contingência inspirado no samba “Dinheiro prá que dinheiro; Se ela não me dá bola; Em casa de Batuqueiro; Só quem fala alto é viola.

 

Eduardo Starosta é economista: eduardostarosta@uol.com.br

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