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Conteúdo 27 de abril de 2009

É só colocar Vossa Excelência na frente

Sempre achei as instituições do Estado brasileiro meio sem seriedade. Isso independe de credo ou posição política. Parece que um requisito para ser um cidadão politicamente ativo e relevante é, se não possuir, pelo menos saber transitar em meio a uma certa marotice.

Tal quadro não é de hoje. Trata-se de uma questão histórica, com raízes no extinto império lusitano. Talvez, a base seja mais antiga ainda, lembrando que os romanos, além de dominarem o mundo e criarem o modelo institucional jurídico que o Brasil ainda adota, foram especialistas em desenvolver os meandros burocráticos que tornaram a idéia de Estado algo tão complexo, que qualquer líder, por mais temido ou respeitado que seja, nunca vai conseguir ter o pleno domínio das atribuições sob sua responsabilidade.

Um avanço recente foi a democratização da informação por meio da internet. Cada vez mais, a vida das figuras públicas vai ficando transparente, tornando situações há pouco corriqueiras, bastante embaraçosas.

O exemplo que mais tem freqüentado a mídia é a questão do uso das quotas de passagens dos Deputados Federais.

Pessoalmente considero questionável o consenso contrário ao uso de tal verba para terceiros. Em primeiro lugar tenho por hábito questionar qualquer consenso.

Mas especificamente sobre a questão, penso que na qualidade de representante de um certo número de eleitores, os parlamentares têm a legitimidade de usar parte dos recursos a eles atribuídos em favor dessa minoria (algo meio a lá Montesquieu).

Claro que o deputado potiguar pisou fundo no acelerador ao pagar a passagem de artistas para o carnaval fora de época de sua cidade. Mas por outro lado, talvez os seus eleitores tenham ficado honrados em ver que seu líder se dá bem com celebridades. E se o povo ficou feliz, quem vai dizer que o uso da verba é ilegítima?

É só uma questão de escolha; de gosto democrático, sem moralidade piegas. Se a atitude for reprovada, ele não será reeleito e fim!

Mas a situação despertou mais uma daquelas cruzadas temporárias por algum conceito de decência que ninguém tem muita certeza do que seja.

Foi até engraçado assistir no telejornal o deputado do baixo clero se gabando dos deslizes dos moralistas e justificando travessuras com o veredito de que “aqui (no Congresso) ninguém é melhor do que ninguém”. Calma, não vamos tão longe: existem os muito melhores; os muito piores; e os intermediários (os mais chatos).

Mas melhor mesmo foi aquele que lamentou:

– Se eu não trouxer minha mulher para Brasília acabo perdendo ela.

Eis um argumento de peso a ser colocado na balança da razão. Afinal, ficaria feio para o Congresso Nacional ser visto como estopim da desunião familiar (He, He, He ).

O assunto é pequeno perto de outras barbaridades que passam quase desapercebidas. Mas parece que dentro de ações de ética questionável no âmbito das autoridades públicas, há um código de conduta que torna tudo mais aceitável. Essa poderia ser uma reivindicação de toda a população.

Falando nisso, nos últimos dias o Brasil também testemunhou o duelo de desaforos trocados no Supremo Tribunal Federal, entre o seu presidente, Gilmar Mendes e o Ministro Joaquim Barbosa. Coisa mais linda de se ver!

As trocas de xingamentos foram antológicas; para não serem esquecidas. E tudo com a devida etiqueta do Vossa Excelência na frente das enxurradas de impropérios, acusações e ironias.

Poxa, se esse clima pintou na maior instância da justiça brasileira, onde decisões do presidente da república e do legislativo podem ser anuladas sem choro nem vela, a idéia de que existe alguma autoridade moralmente intocável no país não passa de uma doce ingenuidade.
 
Lembrando, a moral é um sentimento parcial e subjetivo. O sujeito de esquerda vai sempre falar que a riqueza do indivíduo é imoral. Por outro lado, o opositor ao primeiro tenderá a condenar assistências sociais estéreis.

Talvez esteja chegando a hora de se parar com essa palhaçada de tratar diferenças ideológicas com argumentos sobre o caráter pessoal do oponente. Idéias servem para serem questionadas e eventualmente experimentadas.

Mas a paixão em torno de temas acaba provocando distorções tão profundas na vida pública brasileira, que o non sense acabou dominando os debates e práticas políticas. O pior é que nos acostumamos a isso.

Talvez o episódio do Supremo sirva de lição: o melhor é fazer uma faxina institucional e buscar parâmetros mais objetivos e fundamentais de debate parlamentar, ação executiva e legalidade jurídica. Em outras palavras: exploda-se tudo e vamos brincar de reconstruir!

Mas tem uma coisa: depois de tanta confusão, seria uma judiaria não liberar para o povo a prerrogativa de falar o que quiser, a quem quiser sem ser punido; só colocando o Vossa Excelência antes dos xingamentos.

Por falar nisso, Vossa Excelência @##MN#NMhH@#

 

Eduardo S. Starosta é econimista: eduardostarosta@uol.com.br

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