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Conteúdo 29 de março de 2010

Futuro do País em jogo

Não foi nenhum crítico contumaz ou adversário político do governo quem disse, com todas as letras, que não existe um plano estratégico a médio e longo prazo para resolver a questão do escoamento dos produtos agrícolas – e, por extensão, dos manufaturados – da região Centro-Oeste. Foi o próprio ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, quem afirmou isso, acrescentando que os custos com o transporte de alguns produtos, como o milho, por exemplo, acabam sendo maiores do que o valor do próprio grão.

O raciocínio vale, também, para os produtos industrializados que, à falta de investimentos no modal hidroviário e em linhas férreas, são obrigados a viajar de Goiás, Tocantins, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul até o Porto de Santos sobre rodovias esburacadas e erodidas em vários pontos. Tudo isso representa custos que o fabricante é obrigado a acrescentar ao valor do seu produto, correndo risco de perder mercado.

Segundo dados da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), o custo de transporte de uma tonelada de soja por mil quilômetros, entre Goiás e o Porto de Santos, é de R$ 54,00 no modal hidroviário, de R$ 80,00 no ferroviário e de R$ 105,00 por caminhão. Ocorre, porém, que os modais hidroviário e ferroviário são pouco explorados porque apresentam sérios obstáculos de infraestrutura, ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos, onde são largamente utilizados.

Além disso, apesar dos seminários que volta e meia são realizados em Santos e São Paulo, que mais fazem parte de uma estratégia de marketing do que resultado de uma busca efetiva de soluções, os portos – especialmente, Santos, responsável por 26% do comércio exterior brasileiro – não estão contemplados com projetos que visem à melhoria das vias de acesso das cargas oriundas do interior do País. E aqui vias de acesso incluem os sistemas ferroviário e hidroviário, modais mais competitivos para longas e médias distâncias, como se constata nos números apresentados pela Faeg.

A Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) reconhece que, em se tratando de infraestrutura, o Porto de Santos tem espaço para atender ao incremento da demanda de cargas agrícolas nos próximos quatro anos. É de lembrar que, em 2009, um terço de toda a produção agrícola nacional passou pelo cais santista. Mas, levando-se em conta um horizonte mais longínquo, a Codesp já prevê a necessidade de construção de dois grandes terminais para granéis vegetais em Conceiçãozinha, em Guarujá, e no Largo Santa Rita, na área continental de Santos.

A outra saída – que não significa excluir as demais – é descentralizar o escoamento de grãos com a utilização de portos mais próximos à região Centro-Oeste, como o Porto de Itaqui, no Maranhão, e Pecém, no Ceará. Mas aqui também as perspectivas não são nada animadoras porque não há condições adequadas para o transporte por ferrovia e muito menos por rodovias. A tão decantada Ferrovia Norte-Sul, que terá 2.100 quilômetros de extensão e cortará os Estados do Pará, Maranhão, Tocantins, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Mato Grosso do Sul, ainda está longe de sua conclusão.

Diante disso, o novo governo que deverá sair das urnas em 2010 deveria se preocupar prioritariamente não só em eliminar os gargalos logísticos, como melhorar e expandir tanto a malha rodoviária como a ferroviária, além de investir em hidrovias e dutovias, com a participação da iniciativa privada. Isso é que é fundamental, ainda que outras iniciativas rendam muito mais espaço na mídia.

Afinal, sem atacar frontalmente essa questão, o País continuará patinando.

Mauro Lourenço Dias – Vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
fiorde@fiorde.com.br

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