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Conteúdo 20 de março de 2009

Um se na história

Os historiadores mais ortodoxos não gostam de questionar o que poderia ter acontecido com os rumos da história se algum fato, ou situação tomasse, eventualmente, um rumo diferente. Normalmente, tais profissionais encerram qualquer debate com um seco “não existe o se em história”.

De certa forma eles têm razão. Afinal, fatos são fatos e isso deve ser respeitado, sob o risco de haver distorções comprometedoras da linha da realidade pela qual a humanidade transita.
 
Por outro lado, é um atentado à imaginação cercear eventuais rotas alternativas dos acontecimentos. Hollywood provavelmente concorda com essa opinião, já que várias de suas produções de ficção científica exploram situações alternativas que podem acontecer a partir da transformação do passado. A trilogia De Volta para o Futuro é, talvez, o principal ícone dessa linha de roteiro. Há também o seriado “O túnel do Tempo” dos anos 60.
 
Mas a minha recordação para o momento fica para outro seriado do qual não lembro o nome, no qual uns jovens voltaram ao passado para tentar convencer o Presidente Lyndon Baines Johnson a não atacar o Vietnã, tentando evitar a traumática derrota dos EUA.

Convencido por alguma maneira de que os garotos falavam a verdade, o ator que fazia as vezes de presidente, ao invés de acatar a sugestão, concluiu ser melhor multiplicar os esforços de guerra para destruir rapidamente as forças comunistas… mesmo que isso resultasse em genocídio.

Não vamos questionar se a idéia é certa ou errada ou politicamente correta ou incorreta. Mas, eventualmente, se houvesse a possibilidade de mudar decisões do passado no passado, a linha decisória do roteiro do seriado não seria descabida em termos de lógica formal.

Saindo, agora, da ficção, parece óbvio que erros históricos do passado  têm o poder de direcionar para futuros acertos, quando determinada situação, mais ou menos, se repete.

É o caso da atual crise global. Não importa realmente se as causas do que aconteceu e culminou no colapso do sistema mundial de crédito em setembro último foram ou não repetecos da Grande Depressão, iniciada em 1929.

Mas, apesar de muitos economistas não concordarem, o evento de 80 anos atrás poderia ter tido efeitos bem mais brandos, caso a autoridade monetária norte-americana (Federal Reserve) e governo do país tivessem agido no sentido de evitar tantas quebradeiras e sustentassem a empregabilidade estadunidense via investimentos públicos. Isso só foi feito anos depois… e deu certo!

Nesse sentido, está aparentemente certa a autoridade monetária em evitar, nos dias atuais, uma nova depressão. Os sintomas já estão por demais claros: desemprego; cada vez mais pessoas morando em barracas, contêiners e carros; a produção industrial recuando a níveis de sete anos atrás em apenas seis meses.

Isso justifica a disponibilização de mais US$ 1,15 trilhão para irrigar a economia dos EUA.

Aparentemente, a intenção de emitir US$ 300 bi em papel-moeda (olha a inflação!) e injetar mais US$ 750 bi lastreados em dívidas imobiliárias (gulp) é baixar os juros direcionados às pessoas físicas, para fazer novamente girar a roda do crédito e todas as suas decorrências em termos de geração de empregos e novas oportunidades de negócios.

As chances disso dar certo são boas, impulsionando para a recuperação dos EUA ao cabo de 2 ou 3 anos. Menos é delírio!

Mas será que algo pode dar errado?

Claro que sim. Não podemos esquecer que a raiz dos problemas atuais foi uma ciranda financeira onde um dinheiro artificialmente barato fez com que o endividamento dos norte-americanos chegasse a patamares inéditos.

Baixando os juros ao tomador, o Federal Reserve está dizendo, mais ou menos…

– Pessoal, vamos gastar a rodo, que eu to aqui para garantir a festa!

Claro que nessa linha o entrave da falta de condições para pagar as dívidas tende a surgir em algum momento no futuro. Mas daí o problema é outro. A ânsia dos EUA é resolver o problema no curto prazo, sem mais traumas, se possível.

Sob esse ponto de vista, a China tem certa razão em temer que o governo norte-americano derreta seu próprio dólar, emitindo cada vez mais.

Deixemos, então, que a história siga o seu rumo para ver no que vai dar.

No futuro, até podermos imaginar como seriam as coisas se as decisões fossem diferentes. Mas recontar a história, só inventando a máquina do tempo.

 

Eduardo Starosta é economista: eduardostarosta@uol.com.br

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