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Conteúdo 6 de junho de 2008

Miguel Jorge – MDIC

Em entrevista, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, diz que aumentar os juros é um remédio clássico para combater a alta de preços. Ele, no entanto, afirma que o combate a abusos do mercado – que pode ser feito com mudanças nas tarifas de importação – também deve ser uma arma do governo.

Miguel Jorge disse que as áreas técnicas de sua pasta e do ministério da Fazenda vão fazer um cruzamento de dados para identificar “gargalos”que possam estar provocando aumento do custo das indústrias. Para ele, há um componente especulativo na alta dos preços dos alimentos no mercado.

O ministro acredita que os investimentos no setor produtivo não vão diminuir, mesmo com o aumento da taxa Selic, isso graças aos benefícios fiscais da recém-lançada Política Industrial. Ele rebateu as críticas de que 50% dos recursos do pacote para a indústria tenham beneficiado o setor automobilístico. E enfatizou: o setor vai receber R$ 3 bilhões em incentivos e estará investindo R$ 20 bilhões nos próximos três anos.

Jorge revelou ser contrário à Contribuição Social para a Saúde (CSS) e disse que uma melhora da gestão pública teria mais resultados que um novo imposto, ao defender uma redução da atual carga tributária, equivalente a 36% do Produto Interno Bruto (PIB), para melhorar a competitividade da indústria brasileira.

O crescimento das importações não preocupa o governo, uma vez que o item de maior importância é o de bens de capital, que vem contribuindo para modernizar o setor produtivo e a crescer no momento em que a maior parte das indústrias estão com 90% da capacidade produtiva ocupada.

O atual patamar de valorização do câmbio não tira a competitividade e, ao contrário do que os analistas sustentam, não vem provocando uma “desindustrialização” do país, segundo Miguel Jorge.

A abertura da economia, a burocracia estatal, a questão ambiental e o envio recorde de lucros ao exterior pelas multinacionais, além da estratégia para as empresas brasileiras se fortalecerem no mercado externo são outros temas dessa entrevista concedida com exclusividade à Agência Brasil e à TV Brasil.

Veja uma síntese da entrevista no Repórter Brasil, telejornal das 21h da TV Brasil.

Agência Brasil – Juros é o melhor remédio para esta situação de inflação acelerada?
Pode não ser o melhor, mas ele é um dos poucos. Estamos levantando eventuais gargalos na produção para que a gente possa agir, se houver uma inflação de demanda, em algumas áreas da economia, mas o aumento dos juros é um remédio clássico para esta circunstância.

ABr – O presidente Lula pediu ao senhor e ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, para analisar que medidas podem ser adotadas no combate a inflação?

Ao invés de fazer uma conversa com o ministro Mantega, eu pedi para os nossos secretários que se encontrassem com os secretários da Fazenda, para que eles possam cruzar as informações sobre eventuais gargalos que estejam pressionando a inflação e, para que, eventualmente, se tomem medidas em relação aos gargalos.

ABr – Que medidas?
Medidas clássicas, já que nós falamos em taxa de juros como medida clássica, como redução de tarifas de importação. Se você notar que em algum setor está havendo um aumento indevido, excessivo de preços, que possa estar influenciando o custo das empresas, obrigando a elevarem seus preços, causando mais inflação, certamente você tem que zerar a alíquotas de importação. É uma medida que nós podemos tomar.

ABr – Com o último dado de aumento de 10,5% na produção industrial fica muito difícil dizer que a elevação dos preços é provocada pelo crescimento do consumo. Que outros elementos estão alimentando a inflação? Há especulação?
Há especulação. Isso já é conhecido. O presidente Lula já falou isso. Se você tirar o aumento dos preços dos alimentos da inflação, verá que mais da metade da nova inflação é de alimentos. Com o enxugamento da liquidez no mundo, os grandes fundos e os especuladores começaram a ir para os mercados de commodities, causando aumento nos preços dos alimentos. É verdade que há um aumento no consumo de alimentos em vários países e de consumo do milho para etanol nos Estados Unidos.

ABr – Ao elevar a taxa de juros, o Banco Central não passa um sinal ao empresário de que o custo do investimento vai ficar mais caro?
Realmente isso é uma conseqüência óbvia do processo do aumento dos juros. Uma das coisas que minimizará este efeito é o fato de termos lançado a política de desenvolvimento produtivo, que faz com que se facilite o investimento. O BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], ao passar o financiamento de uma máquina de cinco para dez anos, ou ao acelerar muito a depreciação de um equipamento, que hoje pode ser feito em um ano e não mais em cinco, está promovendo o investimento sem que você tenha efeitos no consumo. Pode ter um efeito importante na redução do consumo o aumento dos juros, mas os investimentos serão afetados positivamente pelos efeitos da Política de Desenvolvimento Produtivo.

ABr – Analistas do mercado apontam o setor automotivo como o principal beneficiado pelas medidas da política de desenvolvimento produtivo, em um momento que a ampliação das frotas de veículos estão agravando os problemas de trânsito das grandes cidades. Além disso, o setor não tem condições de andar com as próprias pernas?
Certos analistas fizeram uma leitura apressada e irresponsável da medida e saíram falando bobagem, quando disseram que a indústria automobilística receberia 50% das desonerações fiscais. Isso é uma deslavada mentira. As desonerações estão em R$ 24 bilhões e a indústria automobilística está recebendo R$ 3 bilhões do total. Isso significa 12%, não 50%.

ABr – Quais são os demais setores que estão recebendo este tipo de incentivo?
A medida que eleva o aumento do financiamento de cinco para dez anos e a depreciação acelerada de investimento é horizontal, pega vários setores da economia. O setor de tecnologia da informação foi o único que recebeu desoneração sobre a folha de pessoal nas exportações de sua produção intelectual. A indústria automobilística, digamos que estivesse recebendo os tais R$ 6 bilhões, é o setor que mais investirá nos próximos três anos.

Foram anunciados R$ 20 bilhões de novos investimentos em três anos, só este ano cerca de R$5 bilhões. Quando você diz que a indústria esta indo bem, está indo bem. Só que a indústria está com 90 % da sua capacidade instalada ocupada. Isso significa que está trabalhando no primeiro turno, segundo turno, terceiro turno, sábado, domingo e feriados. Ninguém agüenta este ritmo. Os trabalhadores não agüentarão este ritmo. É preciso ampliar a capacidade de produção e é exatamente o que estamos fazendo, dando melhores condições para que [as indústrias] ampliem a produção. Quando no mundo, as empresas globais começam a tomar a decisão de onde vão colocar suas novas fábricas, o Brasil tem que se colocar como país capaz de atrair essas novas indústrias.

ABr – E crescimento no uso de automóveis nas grandes cidades?
O problema não é que tenhamos muitos automóveis nas cidades. O problema é que nossas cidades não investiram em infra-estrutura. É uma irresponsabilidade o que aconteceu neste país, em termos de infra-estrutura local, nem estou falando na infra-estrutura dos portos e das rodovias. O automóvel está mostrando para onde vão os impostos cobrados dos veículos que deveriam ir para a infra-estrutura, inclusive para transporte coletivo.

ABr – A ineficiência do setor de transporte acaba sendo um custo distribuído em toda a cadeia de produção?
Um caminhão que precisa chegar ao Porto de Santos levando uma mercadoria, ele tem que cruzar a cidade inteira e, para isso, leva de duas horas e meia a três horas. Além do prejuízo para a importação e a exportação, tem o prejuízo para a cidade de bilhões de dólares por ano, além da poluição.

ABr – As indústrias operando com 90% de sua capacidade, mas a incorporação de mais 20 milhões no mercado consumidor, o senhor acha as políticas de estimulo a produção do seu ministério vão produzir efeito a tempo de evitar uma inflação maior?
No caso da inflação industrial, sim. Agora temos que pensar que uma boa parte da inflação está nos alimentos. Fizemos a liberação, a pedido do ministro Reinhold Stephanes, das alíquotas de importação do trigo, reduzindo o custo dos impostos da Marinha Mercante, para importar trigo do Canadá e dos Estados Unidos a preços competitivos. Aí, temos um paradoxo: o pãozinho está subindo muito e o preço do automóvel, cuja venda cresceu 30%, não está subindo. O aumento dos automóveis no último ano foi de 2,5%.

ABr – E a reforma tributária não poderia ajudar na redução dos custos das empresas?
A reforma tributária está no Congresso Nacional, e espero que o deputado Antônio Palocci tenha razão de que a gente consiga aprová-la até o final do ano. Temos que avançar mais. As tentativas anteriores não foram adiante porque eram mais profundas do que esta e tiveram resistência. Agora temos uma reforma que é possível. A resistência a uma reforma mais profunda não veio dos setores produtivos. Veio dos governos estaduais e municipais.

ABr – Para os setores industriais e comerciais, reduzir imposto pode ser uma saída para ganhos de produtividade e competitividade?
Nós temos uma confusão na legislação brasileira. Hoje, nas empresas você tem áreas só para tratar dos tributos, para preencher papel e planilhas de computadores. Agora, você tem de outro lado um peso excessivo dos impostos sobre a produção, quando deveria ser maior sobre o consumo. Acredito que deveríamos, a partir do momento que o país tem um crescimento sustentável, é o que dizemos que tem, pensar em duas coisas: em reduzir os gastos públicos e mantê-los sob controle, é o que está sendo feito, e reduzir a carga tributária. Nós aumentamos muito a carga tributária quando tivemos que cobrar mais impostos em uma época em que não tínhamos tanta produção para que cobríssemos os gastos públicos.

ABr – É um estrutura tributária herdada de um período de inflação alta?
É exatamente isso. Agora temos que repensar essa estrutura tributária e ir reduzindo, claro que não podemos dar uma “paulada” e ir reduzindo de 36% do Produto Interno Bruto [PIB] para 30% , 28% ou 25%, mas começar a pensar e a discutir o assunto.

ABr – E este novo tributo que está sendo criado para financiar a saúde não pode elevar os custos das empresas?
Se eu considero que deveríamos reduzir a carga tributária? Evidentemente que o ministro do Desenvolvimento tem que ser contra o aumento de carga tributária. E é um aumento de carga tributária. Ontem, um deputado amigo meu dizia que só as pessoas que ganham acima de R$ 3 mil pagariam o imposto. Não importa, é mais aumento de tributo e que vai ser repassado ao produto. O presidente Lula reclamava que nenhum empresário abaixou o preço com o fim da CPMF [Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira].

O empresário não vai baixar mesmo, já está no custo. É assim. Este 0,10% da CSS [Contribuição Social para a Saúde] vai entrar no custo e quando acabar vai continuar no custo. Por isso mesmo é que os 36% [de carga tributária] entraram e está difícil de sair. A questão mais importante, além de ser aprovada ou não a CSS é, por exemplo, que todo o setor do governo, não só na saúde, você tenha gestão. Uma gestão profissional, séria, por exemplo, na saúde, talvez tivesse mais resultado, do que o 0,10%. Não estou falando em relação ao ministro Temporão [ministro da Saúde, José Gomes Temporão], meu amigo, um grande ministro, mas de modo geral. Nós temos que ter uma melhor gestão no governo.

ABr – São os custos da burocracia para as empresas?
Acho que as empresas melhoraram muito a gestão, mas há muita burocracia no país. Eu mesmo passei esses dias por isso. Precisei de um documento para uma destas áreas ligadas ao governo, em que o ministro faz parte, e exigiram que tivesse autenticação com firma reconhecida. Aí, o chefe de gabinete passou o número do decreto, o artigo em que dizia que não é para ter mais isso. Insistiram. No final, acabaram aceitando. A burocracia não é questão brasileira, é de todo o mundo, é um negócio insidioso. Quando ela se instala é mais difícil de tirar do que imposto.

ABr – O Banco Mundial fez uma crítica à nossa forma de concessão de licenciamento ambiental. O senhor acha que é preciso fazer alguma revisão nesta legislação?
Talvez, por sermos magnânimos em anos anteriores na questão ambiental , você teve uma reação dos organismos ambientais que criam dificuldades. Hoje, temos o ministério público envolvido em questão ambiental. Mas, há 20 anos, você tem, no caso das indústrias, normas bastante claras do que pode e o que não pode ser feito, tanto para as indústrias instaladas como as novas. As indústrias querem se instalar com todos os regulamentos atendidos porque é muito mais barato, até pelo fato dos equipamentos mais modernos serem feitos para que não poluam o meio ambiente.

ABr – E as indústrias podem receber recursos para investir em equipamentos anti-poluentes?
No Rio Grande do Sul, há um rio, que de tempos em tempos é poluído por um vazamento de indústria. O que neste momentos não podemos é dar benefícios, é fechar primeiro a indústria que está afetando o meio ambiente. A indústria irresponsável precisa ser tratada como qualquer outro setor irresponsável, com dureza. O desmatamento é um problema. Quando você vê as florestas derrubadas para plantar capim para o gado, é necessário um plano de uso de solo racional em regiões que precisam ampliar produção de soja e gado.

ABr – E o câmbio? O aquecimento da economia está elevando as importações, embora as exportações venham sendo sustentadas pelos preços das commodities no mercado externo.
Não vejo muita possibilidade de queda dos preços. Nós continuaremos exportando bem. Acho que a decisão da Comunidade Econômica Européia vai contribuir para elevação das exportações de carne. Alguns países estão abrindo novos mercados para carnes de frango e suínos. Veja bem, os 10% de crescimento industrial devem-se, em parte, ao aumento da importação de bens de capital que continua crescendo.

ABr – Como o senhor vê a análise de que o câmbio está contribuindo para desindustrializar a indústria brasileira?

Quando o setor de bens de capital, que é o ícone da industrialização de um país, por ser a indústria que faz máquinas, aumentando quase 40% de suas importações no quadrimestre, não consigo ver onde está ocorrendo a desindustrialização. Quando crescemos 10% em termos industriais não consigo ver a desindustrialização. Se nós não tivéssemos este volume de importação de bens de capital, a indústria, certamente, não teria crescido.

ABr – O Brasil hoje já tem suas empresas no exterior. O governo quer ampliar linhas de crédito para fortalecer nossa indústrias no mercado externo?
O objetivo do governo, do nosso ministério e do Presidente da República, é de que as nossas indústrias se internacionalizem. O presidente Lula veio de uma região produtiva em que a maior parte das empresas são multinacionais e ele sabe os benefícios que uma empresa multinacional pode trazer ao país. Se internacionalizadas, elas terão um melhor padrão de comportamento em termos de produção, de relação de trabalho, em termos de economia.

A Friboi, ao comprar a Swift Armur, dos Estados Unidos, permitirá uma exportação maior de carnes do que hoje. Você ter um exportador de carne brasileiro como um dos maiores do mundo é uma grande vantagem competitiva e certamente trará melhores práticas às demais empresas do setor.

ABr – Uma das contas que mais vem crescendo no Balanço de Pagamentos do Brasil é a remessa de lucros e dividendos, que já é maior que o pagamento de juros ao exterior. Isso não preocupa?
Se elas [as empresas] estão mandando muito dinheiro é porque ganham dinheiro legalmente. Não há nenhum problema em relação a isso. É que, pela primeira vez, as empresas estão ganhando dinheiro. Nós passamos muito tempo com as empresas tendo dificuldade de sobreviver por causa da inflação. Imagine uma multinacional que tenha passado, a partir de 1986, por oito planos econômicos e seis moedas. Estas empresas perderam dinheiro por todo este tempo, mas se mantiveram no país. Naquela época, tiveram que trazer dinheiro de fora para não quebrar. Hoje, se elas estão ganhando dinheiro, se estiveram, nos priores momentos, no país, e hoje estão nos melhores momentos, têm o direito de mandar seus dividendos a seus acionistas.

ABr – O Brasil pode abrir ainda mais a economia? Há espaço para reduzir alíquotas de importação?
Nossa economia ainda é muito fechada. Nós temos que abrir desde que tenhamos aberturas em outros países. No caso dos produtos agrícolas, temos alíquotas importantes, mas temos que usá-las para abertura de mercado.

ABr – Em que setores as alíquotas estão elevadas?
Tem vários [setores] com alíquotas elevadas. O setor automobilístico tem 35%. Agora , por que vamos reduzir à toa? Vamos negociar. É o que está fazendo o país nos fóruns internacionais. Reduzir as alíquotas do Brasil desde que eles abram para os produtos agrícolas. Você não consegue exportar etanol para Europa, não consegue exportar carne para Europa. Por que vamos ser bonzinhos? Não. Sempre foi assim, uma troca. Você dá e recebe. Desde que os Fenícios, meus patrícios, começaram a negociar, há dez mil anos, é assim.

ABr – Alguns economistas dizem que não dá para crescer neste ritmo sem gerar inflação?
Um crescimento por volta de 5% do PIB é fundamental ao país. Veja que 20 milhões de pessoas saíram das classes D e E para as classes B e C, portanto, passaram a comer mais, passaram a comprar um liquidificador, uma geladeira. Quando os economistas dizem que não podemos crescer e temos que tomar cuidado com a inflação, claro que temos que tomar cuidado com a inflação, por atingir exatamente estas pessoas. O pior para o pobre é a inflação. O pobre aplica o dinheiro dele em comida. Quando a comida sobre a aplicação dele está dando juro negativo, eles deveriam pensar que, se crescer 5% do PIB, novos 20 milhões serão agregados ao consumo.

 

Fonte: Agência Brasil

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