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Conteúdo 30 de junho de 2008

Frederico Bussinger – Um porto do futuro

A Companhia Docas de São Sebastião (CDSS) foi criada em outubro do ano passado e em pouco de tempo de existência já promoveu um aumento nas operações do porto. Agora prepara a execução de um grande projeto de ampliação para operações de contêineres e granéis sólidos e líquidos. Com as projeções de aumento na exportação de etanol, o Porto de São Sebastião é estratégico, já prevendo uma ligação do modal marítimo com os projetos de alcoolduto, fazendo a ligação com as regiões produtoras do Centro-Oeste e do Interior de São Paulo com o todo o mundo. A principal potencialidade do Porto de São Sebastião é a localização privilegiada, próxima de regiões importantes economicamente, como o Vale do Paraíba, Interior de São Paulo, Região Metropolitana de São Paulo e o Estado do Rio de Janeiro. Entre as vantagens nas operações portuárias estão: um canal de mão dupla para entrada e saída de navios e a possibilidade de construção de berços em águas profundas, para atracação de navios de grande porte. O presidente da Companhia Docas de São Sebastião, Frederico Bussinger, foi entrevistado pela revista Cargo News e explicou como será o novo Porto de São Sebastião.

Como foi a sua formação e qual a sua experiência profissional?

Eu sou engenheiro eletricista e fiz Economia e os créditos de mestrado de Engenharia e Administração. Depois comecei o curso de Direito e no terceiro ano, eu interrompi, quando assumi a Secretaria Municipal de Transportes na Prefeitura de São Paulo. Na época, José Serra, assumiu a prefeitura. No meu último cargo, antes da Companhia Docas, fui Secretário Municipal de Transportes, de 2005 até o segundo semestre de 2007. Quando foi criada a Companhia Docas, o governador me convidou para assumir a presidência, organizar a companhia e conduzir esse projeto de desenvolvimento. Mas, antes da Secretaria, até 2004, eu trabalhei um tempo em consultoria, principalmente nessa área de portos. Antes disso eu fui diretor da Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo), de 2005 a 2008, no Porto de Santos, na época da deflagração do programa chamado "Santos 2000", de arrendamentos do porto. Antes disso, estive no Ministério dos Transportes, na época que foi aprovada a Lei dos Portos. O ministro era Alberto Goldman, entre 1992 a 1994.

O senhor é o primeiro presidente da Companhia Docas de São Sebastião?
Sim, a Companhia Docas começou a existir em outubro do ano passado, vai completar sete meses de vida agora.

E qual é a sua avaliação desse curto período?
O desenvolvimento do Porto de São Sebastião é um desejo antigo, mas os projetos acabavam não se efetivando e o porto tinha uma movimentação sempre em torno de 500 mil toneladas por ano. O interesse do Governo do Estado em assumir o porto foi um trabalho longo, de alguns anos. Veio dentro de um contexto mais geral, ou seja, isso faz parte de um projeto do Governo do Estado de estabelecer uma nova logística no Estado, entendendo que a logística é um dos pilares para o desenvolvimento. Então esse projeto logístico do Estado é um instrumento para alavancar um novo ciclo de desenvolvimento e dentro desse projeto, o desenvolvimento do Porto de São Sebastião é apenas um dos projetos. Quando foi assinado o convênio de delegação com o Governo Federal, em meados de 2007, uma das exigências era criar uma empresa para exercer o papel de autoridade administradora portuária. Essa companhia é a Companhia Docas e a primeira diretoria foi eleita em 15 de outubro do ano passado.

Como está sendo dividido este trabalho?
Nós estamos trabalhando em duas frentes. Existe a concepção desse plano de médio e longo prazo, que é chamado de Plano Integrado Porto – Cidade (PIPC) e uma série de ações de curto prazo, porque há um objetivo de aumentar a movimentação desde já, antes mesmo da implantação desse projeto. Já foi redemarcada a zona primária do porto, que foi alfandegado de maneira permanente. Obtivemos a licença ambiental para a dragagem de manutenção visando uniformizar a profundidade da área da bacia interior, em torno de oito metros e aprofundar o berço externo. O nosso objetivo é chegar aos nove metros e meio, apesar de que vai depender da monitoração da estrutura que está lá. Também assinamos o contrato com a empresa que vai implantar o gasoduto de Mexilhão, que assinamos em janeiro, aliás, no dia da abertura dos portos e os tubos devem começar a chegar já no próximo mês. Então já aconteceram diversas coisas desde então.

Legalmente o porto pertence a quem?
Quem tem a responsabilidade pela administração do porto, o poder originário é da União. O Estado de São Paulo tinha uma concessão que venceu no ano passado. Essa figura da concessão da autoridade portuária já não existe mais dessa forma. A figura legal, agora, é chamada "delegação". Foi assinado esse convênio de delegação entre o Governo Federal e o Governo do Estado de São Paulo por 25 anos, prorrogável por mais 25, quer dizer, 50 anos estimados. Em função desse convênio é que foi criada a companhia.

Sobre esse novo gasoduto, ele vai ligar plataformas marítimas ao porto?
A plataforma está sendo construída. Esse é um projeto novo, é um projeto na Bacia de Santos específico de gás e é chamado Projeto Mexilhão. Ele prevê as plataformas em alto mar, o gasoduto tem 185 quilômetros e a base industrial está em Caraguatatuba. A partir dali tem o gasoduto que sobe para o planalto, para a distribuição. Está tudo para ser construído. Existe o oleoduto, que sai do terminal da Petrobrás, que fica dentro do porto albergado, mas ele é um terminal privativo de uso misto. É desse terminal, chamado TEBAR (Terminal Marítimo Almirante Barroso), que sai o oleoduto.

Quais os projetos para o Porto de São Sebastião?
Nós temos uma meta de curto prazo de dobrar as operações com a infra-estrutura atual e temos o projeto de médio e longo prazo de expansão de uma área total de 1 milhão de metros quadrados com os terminais especializados de off shore, para granéis, contêineres, para etanol e para veículos. Esse é um projeto com a construção de novos berços para atender as especificidades dos navios, no caso de contêineres, com 16 metros. No caso de granel líquido, (de combustível) de 22 metros.

Os berços que necessitam de maior profundidade serão construídos longe da costa?
Exatamente. No caso do contêiner, vai ter uma ponte e um píer a 400 metros do porto, aproximadamente. A linha de frente vai ter quatro berços de 300 metros com 12 metros de profundidade. A bacia interior vai ter cerca de 400 metros de berços contínuos com 8 metros de profundidade e vão ter os dois piers com 22 metros de profundidade para exportação de etanol. Haverá também a construção de dois novos piers da Petrobras para a movimentação de petróleo, próximos aos de etanol.

Qual o prazo do projeto?
Ele está sendo estudado no sentido de atender todas as exigências legais. Nós temos exigências de natureza ambiental, exigências na modelagem e na licitação, mas do ponto de vista de concepção, eu diria que o prazo está concebido, e, mais: existem interessados para cada um desses terminais. No caso do etanol têm vários interessados, que, inclusive, formalmente já se colocaram. Há uma formalidade que o interessado requer para a abertura do processo do arrendamento e nós já tivemos vários desses pleitos para os diversos terminais.

A "jóia da coroa" será o etanol?
O etanol é umas das áreas principais, aliás, no caso do etanol, esse projeto no porto está associado ao alcoolduto e com os tanques de armazenagem em vários pontos do Estado, a começar do próprio Vale do Paraíba.

Será o principal ponto de escoamento para o mercado internacional de etanol?

É uma alternativa muito competitiva sim, principalmente porque existe uma profundidade natural de 25 metros no canal e a possibilidade de construção de píers, de berços de atracação em águas profundas. Isso vem bem ao encontro das necessidades desses navios tanque, que são navios que normalmente requerem profundidade grande.

Então a interligação do modal marítimo com o alcoolduto é essencial?
O etanol pode chegar de caminhão, se quiser. Só que do ponto de vista econômico, não faz sentido. Para que o etanol seja competitivo, em nossa exportação, eu acho que o alcoolduto é uma coisa imprescindível.

Um dos principais problemas do porto é o acesso rodoviário?

Esse é um Plano Integrado Porto – Cidade, isso não é um mero jogo de palavras, isso é um conceito importante porque, vários planos no Brasil, vários portos enfrentam dificuldade na interação com a cidade. Agora, uma outra dificuldade que enfrentam, com os arrendamentos feitos na “primeira geração” da Lei dos Portos, é que os projetos focavam muito na questão portuária e não tratavam da ligação com os outros sistemas, com os acessos, que é algo que nós já queremos tratar no nascedouro com esse projeto também. Não são somente as interações com as cidades, mas, também as interações regionais que, aqui no caso, a gente viu pelo menos duas: com a dutovia para a operação com o etanol e o acesso rodoviário. Então está previsto: a duplicação da Rodovia dos Tamoios e a construção do contorno de Caraguatatuba e São Sebastião, justamente para desonerar o viário da cidade na circulação dos caminhões.

O modal ferroviário faz parte dessa intermodalidade?
Não está previsto, apesar de que nós sabemos que existem grupos que estão estudando o acesso ferroviário, mas não está incluído no projeto.

Esse projeto já está finalizado?
O termo que a Lei prevê chama-se PDZ (Plano de Desenvolvimento e Zoneamento). Isso é uma obrigação que nós, enquanto porto, temos, dentro da Lei dos Portos. Mas as cidades também têm suas obrigações decorrentes dos estatutos das cidades, dos seus planos diretores. E os planos diretores de cidades portuárias sempre prevêem um capítulo, uma seção, falando sobre a orla portuária. O nosso objetivo, e isso nós temos discutido com a Prefeitura, é de que esse plano possa ser simultaneamente o PDZ do porto, atendendo a Lei dos Portos, e que também seja o capitulo da orla portuária do Plano Diretor da Cidade, que atende o estatuto da cidade.

Já há um planejamento para evitar conflitos?
Essa é a nossa idéia, de resolver desde logo, compatibilizar os projetos do porto e da cidade e também do porto com os sistemas de transportes regionais.

Como será a execução?
Bussinger: Nós podemos entender como um estudo de concepção, ou seja, isso é uma concepção do projeto. Nós estamos trabalhando em três frentes. A primeira delas é a de engenharia e arquitetura, o projeto básico do porto, ou pré-básico. A segunda parte é ambiental, devemos receber, para protocolar até junho, o plano de trabalho para ter o termo de referência do Estudo de Impacto Ambiental, o EIA-RIMA. A terceira frente é a chamada modelagem, que é a análise econômica e financeira, o estudo de viabilidade técnica e econômica, que é necessário para a licitação. Ao longo do segundo semestre, essas três frentes deverão estar trabalhando e a expectativa é de que no primeiro semestre de 2009 seja possível colocar a licitação na rua. Devemos colocar simultaneamente as licitações dos diversos terminais: base off shore, terminal graneleiro, etanol e terminal de contêiner.

O novo porto terá "selo verde"?
Essa idéia do "porto verde"é uma tendência internacional. O tema ambiental tem dominado a agenda internacional e os portos em particular, porque os portos, normalmente, estão sempre em uma condição natural, estão próximos do mar ou dos rios e são áreas sempre muito sensíveis. Esse tema ambiental tem chegado aos portos com muita intensidade. E os portos passaram a ter programas de recuperação ambiental e têm sido muito bem sucedidos. Como no caso da Europa, onde diversos rios, onde era impossível de se usar a água, não havia seres vivos, peixes, eles foram recuperados e áreas que tinham sido degradadas nas cidades foram recuperadas. Então isso é uma bandeira, é uma diretriz para o porto.

O novo porto já está sendo projetado para funcionar com as tecnologias do futuro, como por exemplo, a não utilização de papel?

O porto não é uma empresa, isso no Brasil e no mundo, onde há uma hierarquia piramidal. O porto é uma interação de duas constelações: uma constelação pública e uma constelação privada. Na constelação pública, há um conjunto de autoridades marítima, portuária, ambiental, sanitária e alfandegária. Na constelação privada há o armador (que é o operador do navio), os operadores portuários, os arrendatários, os trabalhadores (que têm organizações específicas nos portos), os transportadores os donos da carga. No porto, há uma interação muito grande do setor público-privado, obviamente, que cada um desempenhando o seu papel, há muita necessidade de informação. Tradicionalmente isso era feito por papel, mas com o desenvolvimento da telemática, hoje em dia, tem-se incorporado muito ao dia-a-dia de todo mundo. O problema é que cada um desenvolve o seu sistema. Aí a dificuldade é de comunicação. Como nós estamos desenvolvendo um projeto bem do início, a idéia é que a gente já conceba esse sistema de comunicação como parte já do projeto. A nossa bandeira é o porto "sem papel". O limite é não ter papel, não ter mesmo, agora se tiver, será muito pouco.

Como será a relação público-privada no porto, será concessão, abertura de capital?
O modelo, de uma forma geral, está definido na Lei dos Portos. Alguns detalhamentos que podem acontecer, mas a grande baliza está lá na Lei. E qual é esse modelo? Genericamente e internacionalmente eles chamam o sistema de "land lord", e o que é isso? O Poder Público exerce o papel de autoridade administradora, ele trata da infra-estrutura básica e coordena os planos de expansão, os cuidados ambientais e os acessos ao porto. O investidor privado trata da infra-estrutura específica, dos equipamentos e sistemas e a gestão da operação. Essa relação público-privada está mais ou menos definida. Eu diria que haverá a convivência do Poder Público, na autoridade administradora portuária e que convive com alguns operadores, (hoje há cinco operadores) e com arrendatários. Não há arrendatários ainda. Se a gente olhar daqui a cinco, dez anos, vai ter a autoridade portuária, junto com as outras autoridades (alfandegária, marítima, ambiental, sanitária) terá um conjunto de operadores atuando nas instalações públicas e terá um conjunto de arrendatários, gerindo terminais específicos de carga. Esse é um modelo mais geral.

O arrendatário fica com uma parte do cais?
Vamos tomar o caso do contêiner, que é talvez a coisa mais emblemática. Está se prevendo um terminal de contêiner, com cerca de 500 mil metros quadrados, com quatro berços de atracação, com 16 e 14 metros. O arrendatário vai ser responsável para fazer os investimentos para implantar esse terminal, construir o píer, equipar os pátios e depois disso ele vai operar esse terminal. Isso não é novidade, já há uma série de arrendatários no Brasil. Eu mesmo, enquanto estive no Porto de Santos, participei e assinei uma quantidade grande de contratos de arrendamento e depois na parte de consultoria eu atuei tanto fazendo a modelagem e os editais, participando de julgamentos, quanto preparando propostas.

Qual a diferença entre operadores e arrendatários?
São duas coisas independentes, apesar de que normalmente o arrendatário é também operador, mas nem todo operador precisa ser arrendatário, porque isso? O porto precisa ter uma norma de pré-qualificação de operador. O operador é aquele que tem contrato com o armador, com o dono da carga, tem o equipamento próprio, contrata mão-de-obra avulsa. Ele organiza esses componentes da produção e opera no cais público. O arrendatário opera na sua área arrendada e ele muitas vezes é operador, não é uma obrigação legal, mas a prática é que o arrendatário é também operador. O operador não precisa ser obrigatoriamente arrendatário porque ele pode operar no cais público.

Atualmente o Porto de São Sebastião não trabalha com contêiner?

Já teve no passado, 10 anos, 15 anos atrás. Enquanto todo mundo operava com o chamado "pau de carga", ou seja, o equipamento de bordo do navio, a produtividade era mais ou menos igual, mas a partir de 95 e com mais intensidade em 96, 97, os terminais foram se modernizando aceleradamente. Então foram colocando os equipamentos com maior produtividade, sistemas informatizados e como São Sebastião não teve nada disso, ele hoje se for operar contêiner, vai operar com "pau de carga". Ora, a produtividade é um décimo, então economicamente ele não tem condição de competir. Se não tiver os equipamentos de terra, se não tiver os sistemas de telemática e tudo, não será competitivo e principalmente se não tiver escala, porque isso é uma outra coisa. Porque contêiner precisa de dimensão. Hoje não faz sentido fazer um terminal pequenininho, porque senão o navio nem para, o navio só vai parar se você tiver um terminal grande.

O Governo do Estado está estudando um plano de logística e o Porto de São Sebastião está incluído?

É o PDDT (Plano Diretor Desenvolvimento dos Transportes), que é coordenado pela Secretaria dos Transportes. Eu até fui consultor no plano anterior e agora participo das discussões e do plano de logística mais geral, que está sendo feito pela Secretaria de Desenvolvimento, como representante do porto.

Dentro desse estudo, há possibilidades de São Sebastião desafogar o Porto de Santos?
É uma alternativa importante. Ele, inclusive, tem uma vocação, está bem defronte a uma área bastante desenvolvida no Estado de São Paulo, uma economia muito pujante que é o Vale do Paraíba, e, de certa forma, também acessando o Sul Fluminense e a Região de Campinas, pela rodovia Dom Pedro e que certamente poderá trazer benefícios até para a Região Metropolitana de São Paulo, para o trânsito, sendo uma alternativa. Ele não é um competidor, ele é um porto pequeno, nunca será um porto grande como Santos, em tamanho, certamente. Mas ele é uma alternativa importante para o segmento da logística do Estado.

A Região de Campinas já movimenta carga no porto?

Essa ligação já existe. A rodovia D. Pedro já está duplicada e a rodovia Tamoios é pista simples, tripla onde é necessária. Hoje já há caminhões de Campinas que chegam ao porto, ou ao contrário, caminhões que descarregam a barrilha e que vão para a Região de Campinas. O que está se discutindo é uma melhoria das condições na Tamoios e principalmente do contorno, para acesso direto quando se chega na baixada, porque a região entre Caraguá e São Sebastião é toda uma área urbana.

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